A estimativa é de que haja hoje 600 milhões de cachorros de rua no mundo – aproximadamente um para cada 11 pessoas –, segundo pesquisas do Instituto Smithsonian, dos Estados Unidos. Sensibilizado com essa quantidade e com a morte de sua cadela Rosalie, o fotógrafo belga Frank Bruynbroek decidiu que dedicaria parte de sua vida a fazer retratos de cães de rua que foram adotados.
O resultado desse trabalho pode ser visto no livro Compawssion (brincadeira linguística com a palavra compassion, que significa compaixão, e paw, pata, em português), lançado nos Estados Unidos em outubro de 2012.

A obra inclui não só 106 retratos de cães, como também entrevistas com celebridades que adotaram cachorros de rua e incentivam a prática. Entre eles, estão os artistas norte-americanos Ellen DeGeneres e Katherine Heigl, além do ator chinês Jackie Chan e do roqueiro Ozzy Osbourne. Essas fotos também farão parte de uma exposição nos Estados Unidos, onde Frank, 55 anos, vive desde 1986. E se tudo der certo, rodará o mundo.
Mas fotografar nem sempre foi a prioridade de Frank. Antes de se envolver a fundo com retratos, ele exerceu várias atividades: foi professor de francês para crianças norte-americanas, monitor de acampamento na França, diretor musical do cantor belga Julos Beaucame, diretor decasting e de comerciais para uma empresa belga, ator nos Estados Unidos e sócio de uma empresa que organiza viagens para franceses rodarem com motos Harley-Davidson em estradas norte-americanas.
Na época em que era professor, entrou em contato com a fotografia: ganhou uma Leica antiga do irmão e, tendo gostado da experiência, comprou uma Nikon F de segunda mão. Em todas as profissões que exerceu, sempre a carregou. “Não pensava muito para fazer as fotos. Apenas tentava fazer com que ficassem boas e bonitas”, recorda.

a foto está no livro. Foto: Frank Bruynbroek
A descoberta
Ao fazer um workshop com o orador Breck Costin (chamado de Liberdade Absoluta), Frank descobriu sua verdadeira paixão. Propondo colocar em debate valores e questões morais, o curso implantou em Frank a dúvida de qual seria a missão dele. E, entre várias possibilidades, descobriu que a resposta certa era a fotografia.
Começou fotografando casamentos de amigos e depois passou a fazer portfólios de atores. E, em 1995, após a morte da cadela Rosalie, enquanto espalhava as cinzas pelo parque favorito dela, ele decidiu que fotografaria cachorros – mais especificamente, os que recebem uma segunda chance ao serem retirados das ruas.
Inicialmente, ele recorria aos amigos que tinham resgatado cachorros. Às vezes, quando estava andando na rua e via um cão bonito, o fotografava. Mas, conforme foi ganhando notoriedade, passou a cobrar para fazer retratos de cachorros adotados, nunca esquecendo da autorização para usá-los para a arte.
O trabalho exige no mínimo duas horas prévias para o fotógrafo fazer amizade com o cachorro e dar um treinamento básico (sentar e ficar parado) por meio de guloseimas. Na opinião de Frank, fotografar cachorros que foram abandonados é mais fácil do que registrar cães comprados. “Tenho a impressão de que cachorros resgatados são mais colaborativos”, diz. “É apenas uma generalização, mas geralmente verdadeira. Vira-latas têm uma personalidade melhor. Eles valorizam o que está à volta deles e não consideram nada como já garantido”, observa.
Depois, na hora do clique, prepara o cenário (sempre com luz natural), ajusta o foco, estimula o cão com brinquedos ou sons inesperados e escolhe o melhor momento. E, no caso de Frank, o momento é realmente importante: “Como ainda fotografo com filme e não posso dizer aos donos como ficou a foto, vou embora quando considero que já fiz as melhores imagens”, conta. Deixada de lado a Nikon F de segunda mão, a câmera que usa atualmente é uma Canon 35 mm com filme P&B, que considera mais real e intenso por fazer o observador firmar o olhar apenas no que é importante, sem distrações com cor.
Atento à grande quantidade de cachorros abandonados no mundo, a intenção de Frank é, com o livro, divulgar a adoção de cães, em vez da compra. Ao comprar os animais, diz o fotógrafo, os consumidores negligenciam o fato de que os 600 milhões de cães de rua se reproduzem, gerando cada vez mais.
Inspirações

Grande parte dos fotógrafos tem uma inspiração para o trabalho que desenvolvem. O maior inspirador de Frank foi o próprio pai, que, em tempos de dificuldade, se fechava em seu escritório para fazer pinturas em P&B. Em segundo lugar, está o húngaro André Kertész (1894-1985). “Ele abriu meus olhos para o fato de que uma fotografia ganha vida dependendo de onde você posiciona a câmera”, conta Frank.
Entre as outras inspirações, está o francês Henri Cartier- Bresson (1908-2004), por “sempre capturar a mágica do momento”, e o norte-americano Richard Avedon (1923- 2004) e o turco Yousuf Karsh (1908-2002), por serem, em suas palavras, “mestres retratistas”.