Os fotógrafos normalmente se escondem por trás de suas imagens. São poucos os que transformam em tema os episódios da vida particular. O cearense José Albano, que recentemente completou 40 anos de carreira, é uma das exceções. Sua obra fotográfica confunde-se com sua vida, alimenta-se dela.
Essa relação começou um pouco tarde. Filho de fotógrafo amador, Zé Albano, como é chamado familiarmente, só foi fazer a primeira fotografia quando tinha 22 anos, a bordo de um Boeing 707 que o levava aos Estados Unidos, em 1966. Cursando Letras, ele havia ganhado uma bolsa para estudar inglês durante seis semanas. Seu irmão mais velho, Joaquim, foi quem insistiu para que ele levasse uma câmera na viagem.
Foi “paixão ao primeiro clique”, como define Zé Albano. Ele voltou 45 dias depois com 600 slides batidos e a certeza de que queria tornar-se fotógrafo. Comprou câmera nova, montou um laboratório p&b e passou a devorar livros e manuais de fotografia. Depois de formado, mudou-se para o Rio de Janeiro (RJ), onde conseguiu um emprego na revista Manchete, na área de banco de imagens. Ele editava o material enviado pelos fotógrafos e disponibilizava para venda.
A experiência foi interessante no começo. Zé Albano conheceu muitos profissionais, mas não estava satisfeito, pois fazia um trabalho de gabinete, não atuava com a câmera na mão. Inquieto, buscou informações no consulado norte-americano sobre bolsas de estudos nos Estados Unidos.
“Pesquisei as opções de mestrado em fotografia e me inscrevi. O coordenador do programa de bolsas me perguntou porque queria estudar fotografia se havia me formado em Letras. Então, inventei na hora que, já que não havia cursos de graduação em fotografia no Brasil, resolvi estudar Letras para aprender inglês e tentar estudar nos Estados Unidos. O argumento convenceu e eu consegui a bolsa”, conta.



Mestrado e contracultura
O mestrado na Universidade de Syracuse, com duração de dois anos, deu ao fotógrafo autodidata todo o conhecimento técnico e prático para o domínio de diversas áreas da fotografia. Zé Albano entrou em contato com uma grande estrutura didática e de equipamentos e teve a chance de se aprofundar na prática de estúdio e de laboratório.
O início da década de 1970 era o auge da contracultura e do movimento hippie, da liberação sexual trazida pelas pílulas anticoncepcionais e de uma juventude inquieta que contestava a guerra do Vietnã. O contato com esses acontecimentos causou em Zé Albano uma profunda mudança de pensamento.
“Eu mudei e muito, não só a minha concepção de vida mas também minhas pretensões profissionais. Fui fazer mestrado pensando que, na volta, iria me radicar em São Paulo e ser uma estrela da fotografia nacional ou coisa parecida… Mas voltei para o Ceará, sem pretensão de fama ou fortuna, onde pude exercer minha profissão, priorizando sempre a qualidade de vida”, recorda.
Antes de voltar a Fortaleza (CE), Zé Albano se aventurou em uma viagem de um ano pela Europa. Ele resolveu realizar o sonho de muitos fotógrafos na época, fazer um “grand Tri-X tour”, como eram chamadas as longas viagens para fazer fotos com o filme p&b Tri-X, da Kodak, comprado em rolo e rebobinado. Dos 200 dólares que dispunha, gastou a metade com a passagem aérea de Nova York à Amsterdã, na Holanda.
Mesmo assim, conseguiu viajar por um ano e visitou 12 países. Como fez tanto com tão pouco? Os deslocamentos eram de carona. Com uma mochila e um saco de dormir, repousou nos mais diversos lugares: bancos de praças, estações, debaixo de pontes, em campos, parques e até sobre túmulos.
A refeição era feita à base de pão com manteiga, frutas recolhidas em fim de feira, enlatados, além de sopas, macarrão, batatas, ovos e chá preparados em um pequeno fogareiro a álcool. Como havia levado pouquíssimo dinheiro, Zé Albano chegou a trabalhar por quarenta dias para uma família francesa durante a colheita de uvas.
A aventura rendeu cerca de seis mil fotos com o Tri-X, feitas com uma Nikkormat equipada com as objetivas fixas de 28 mm e 135 mm, além de dois mil slides coloridos feitos com uma Olympus Pen, câmera de meio quadro.


